É enorme o potencial da Operação Lava Jato para impor a cassação de dezenas de deputados federais e senadores
No aguardo da lista do Petrolão, parte do Congresso que assume em fevereiro não terminará o mandato. Como isso pode influir num ano em que os parlamentares terão uma agenda complicada de votações e a oposição promete não dar trégua ao governo...
Sobre o Congresso que será empossado no dia 2 de fevereiro de 2015 há muitas dúvidas e uma certeza: parte dele não terminará o mandato. Muitos dos parlamentares que assumirão suas cadeiras não chegarão ao fim da Legislatura. Afinal, é enorme o potencial da Operação Lava Jato para impor a cassação de dezenas de deputados federais e senadores. Resta saber quem e quantos serão atingidos. No mesmo mês em que os parlamentares tomam posse, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, promete apresentar sua denúncia ao STF. Já se sabe que quase metade da Câmara dos Deputados eleita em 2014 foi financiada com recursos das empreiteiras investigadas pela Polícia Federal e que essas empresas despejaram nos partidos políticos mais de R$ 264 milhões em doações oficiais, também usadas pelo esquema do doleiro Alberto Youssef para lavar dinheiro desviado de contratos da Petrobras. Haveria ainda uma lista de quase 60 nomes de políticos beneficiados com propina, segundo o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, dos quais 28 já são conhecidos.
Com a legitimidade de seus mandatos em xeque e a espada de Dâmocles do Supremo sobre a cabeça, o retrato institucional não poderia ser pior: um Legislativo manco que tem pela frente uma difícil e urgente agenda de reformas, que inclui ajustes fiscais imprescindíveis para recuperar a credibilidade da economia e voltar a atrair investimentos. Se o Palácio do Planalto tem sua responsabilidade em propor uma saída para a atual crise econômica, caberá ao Congresso transformar essas propostas em leis. Mas sem força e, sobretudo, debaixo de suspeição fica tudo mais difícil. Basta lembrar a dificuldade que foi no fim da última legislatura a aprovação do projeto que reduziu a meta de superávit do governo. Há novas medidas de arrocho fiscal para 2015, que pressupõe a redução de benefícios sociais, o aumento de tributos e a rejeição de reajustes do funcionalismo público. Tudo isso precisará passar pelo Congresso, que se mostrou pouco voluntarista ao aprovar, antes do recesso, novo aumento salarial dos parlamentares, contrariando pedido dos futuros ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa.
Não bastassem os desdobramentos da Lava Jato, o Congresso que saiu das urnas em 2014 está mais fragmentado, composto por 28 legendas organizadas inicialmente em 17 bancadas, e conta com uma oposição combativa, que já deu mostras no fim de 2014 de que adotará, sob a liderança do senador Aécio Neves, uma postura distinta daquela observada nos últimos 12 anos. Aécio saiu da eleição presidencial maior do que entrou e, com amplo apoio da opinião pública, não pretende dar trégua ao governo. Esse novo cenário incorpora ainda uma importante cisão dentro do PMDB, que deverá eleger o controverso deputado Eduardo Cunha para comandar a Câmara. Eleito presidente, Cunha deverá representar uma incógnita para o governo. Ora poderá atuar em sintonia com o Planalto, ora do outro lado da trincheira política.
O controverso Eduardo Cunha é o mais cotado para presidir a Câmara, enquanto o senador Renan Calheiros (abaixo) tende a ser reconduzido à presidência do Senado. Os dois representam uma incógnita na relação com o governo.
Foi pensando em tentar garantir o mínimo de estabilidade no Congresso que a presidente Dilma Rousseff se rendeu novamente ao fisiologismo político, contemplando os partidos aliados com cargos na Esplanada. Nessa tática desesperada, Dilma irritou o próprio PT e alas importantes da esquerda, como movimentos sociais. Foi assim, por exemplo, com a nomeação do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) para o Ministério das Cidades e da ruralista Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura. Ex-DEM, Kassab já foi pupilo do tucano José Serra, mas se bandeou para o lado governista ao criar seu próprio partido. Já a presidente da Confederação Nacional da Agricultura não era sequer aceita como nome do PMDB, mas sua indicação satisfez um compromisso de Dilma com o setor agropecuário – que tem peso enorme na formação do PIB.
Uma vez fechado o primeiro escalão, Dilma continuará sofrendo pressão para entregar outras joias da coroa, como os comandos de estatais e autarquias. A preocupação em atender a interesses partidários só não é maior que o temor de fazer as escolhas erradas, nomeando gente que posará a seu lado na foto do dia 1º de janeiro e meses depois estará figurando nas manchetes do noticiário policial. Para tentar se blindar desse tipo de ameaça é que a presidente chegou a propor ao Ministério Público que a ajudasse a escolher – no caso vetar – seus ministros, uma iniciativa encarada pela oposição como sinal de fraqueza e pelos procuradores como uma espécie de “cilada” que serviria apenas para dividir responsabilidades sobre futuros escândalos. Afinal, Dilma tem algumas de suas principais colaboradoras envolvidas no Petrolão. Além de Graça Foster, a ex-ministra Gleisi Hoffmann, senadora citada por Costa em sua lista de beneficiários da propina. Com mandato até 2019, ela faz parte dos congressistas que correm o risco de não concluir o mandato, ao lado dos senadores petistas Humberto Costa (PE) e Lindbergh Farias (RJ), dos peemedebistas Renan Calheiros, que deve ser reeleito presidente do Senado, e Edison Lobão, que retorna ao mandato após ser substituído no comando do Ministério de Minas e Energia pelo senador do PMDB Eduardo Braga – uma boa exceção no novo Ministério de Dilma Rousseff que confirma a regra. Também integram o rol dos suspeitos os peemedebistas Valdir Raupp (RO) e Romero Jucá (RR), além de Ciro Nogueira (PI) e Benedito de Lira (AL), do PP.
Citado na lista do delator Paulo Roberto Costa, Henrique Eduardo Alves deixou o comando da Câmara e ficou sem cargo no primeiro escalão do governo.
Esses são apenas alguns nomes entre os 28 citados na delação de Costa. Mas a força-tarefa da Lava Jato estima que o número final de parlamentares da ativa envolvidos seja três vezes maior. Com tanta gente pendurada, não dá para esperar que os demais colegas de plenário decidam cortar na própria carne e abrir processos de cassação que corram tão rápido quanto o que baniu André Vargas (PT-PR), que antes do escândalo do Petrolão era uma das figuras mais prestigiadas pelo governo na Câmara. Na época do julgamento do mensalão, Vargas assumiu a linha de frente na defesa dos petistas condenados. Mas, em vez de solidariedade de seus pares, colheu desprezo e foi isolado para evitar danos colaterais à campanha de reeleição de Dilma. Sem a pressão do período eleitoral, espera-se que o corporativismo agora fale mais alto. Para piorar, caso sejam abertos, os processos de cassação deverão se arrastar por meses, fazendo o Legislativo sangrar em praça pública durante todo o ano de 2015, contaminando quaisquer novas CPIs e minando ainda mais sua imagem já tão desgastada.
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