Plano do PSB é fazer do político uma liderança nacional do partido
O celular apita avisando que chegou uma mensagem e o futuro governador Rodrigo Rollemberg (PSB) olha o visor para ver quem a enviou. Trata-se de um recado de sua mulher, Márcia Helena. Ele lê o texto curto “me liga” e põe o telefone de lado. Em seguida, diz em voz alta para si mesmo: “Depois eu retorno”.
Não passam nem dois minutos, mais um toque. ...
Dessa vez é Hélio Doyle, chefe da Casa Civil, informando que o rombo nas contas do Distrito Federal pode passar da casa dos 4 bilhões de reais. Rollemberg está no apartamento da mãe, Teresa, na 206 Sul, onde viveu por vinte anos. Na sala, com clima de quartel-general político, há três mesas e 38 cadeiras. Uma das empregadas da casa oferece um café preto, ele diz que aceita, mas não sobra tempo para tomá-lo. Veste um terno azul três números acima de suas medidas e desce às pressas para fazer fotos nos pilotis do prédio. No caminho, pede a um assessor que comunique seu atraso para o próximo compromisso. Minutos depois, ele some de vista a bordo de um Fiat Freemont particular. É nesse corre-corre que o mais novo comandante do Distrito Federal se aquece para encarar o maior desafio de sua vida a partir de quinta (1º): tirar Brasília do buraco. Com saldo negativo e afogado em dívidas públicas, o Palácio do Buriti tornou-se uma bomba prestes a explodir. Sem dinheiro no caixa, será quase impossível o governador realizar, a curto prazo, suas principais promessas de campanha. Nesse contexto, manter serviços básicos num primeiro momento já começa a soar um grande feito diante de sucessivos calotes em áreas como transporte, saúde, educação e cultura. Uma das seis empresas que fazem a coleta de lixo, por exemplo, tem para receber cerca de 80 milhões de reais, soma de atrasos nos repasses desde setembro. Com essa dívida em aberto, ver caminhões de limpeza nas ruas tornou-se algo raro.
Do alto de seus 55 anos, o político de 1,75 metro de altura e voz mansa sabe bem o tamanho da encrenca que o aguarda. Apesar de ter nascido no Rio de Janeiro e ter pais sergipanos, ele chegou a Brasília com menos de 12 meses de vida. Dono de quase nenhuma experiência em gestão pública, construiu a sua carreira aqui por força das circunstâncias. Foi assim que conseguiu o seu primeiro emprego na capital, aos 20 anos. O pai, Armando Sobral Rollemberg, na época ministro do Tribunal Federal de Recursos, pediu ao amigo e ex-senador Augusto Franco, um poderoso usineiro sergipano, que alocasse o filho no Senado. Armando tinha um forte motivo para recorrer ao conterrâneo. O jovem estudante já namorava Márcia Helena e ela estava grávida aos 18 anos. Quando contou ao pai que sua garota esperava um bebê, ele levou uma bronca tão enérgica que os berros do patriarca eram ouvidos nos pilotis do prédio. “Como você vai sustentar um filho sem trabalhar?”, indagou Armando. Márcia Helena, lá embaixo, escutou tudo. O dramático momento só ganhou ares mais tranquilos garantiu a Rollemberg o posto vitalício que lhe rende — quando está no batente — um salário de 30 000 reais. Cinco anos depois, viria o estreitamento com a política na sua filiação ao PSB. Em 1990, ele disputou e perdeu sua primeira eleição para deputado distrital. Não esmoreceu. No pleito seguinte, enfrentou as urnas e fracassou de novo, mas acabou como primeiro suplente do deputado Wasny de Roure (PT). Como a sorte e Rollemberg andam de mãos dadas, o petista foi convidado para ser secretário da Fazenda do governo de Cristovam Buarque e abriu caminho para o socialista se sentar numa cadeira de deputado distrital. Esse primeiro caminho, trilhado por coincidências, faz com que os amigos mais próximos digam que ele nasceu de quina para a lua.
Segundo vários analistas políticos, acreditar que Rollemberg se tornou governador com um grande empurrão do destino também faz muito sentido. No início da corrida eleitoral, ele nem sequer era apontado como um dos favoritos. Estava bem atrás de José Roberto Arruda (PR) e Agnelo Queiroz (PT). Só depois que Arruda foi expurgado do certame pela Justiça, sua candidatura ganhou fôlego. No segundo turno, com o governador e a máquina estatal fora de combate, ele enfrentou um Jofran Frejat (PR) enfraquecido pelo pouco tempo de campanha e pela estreita ligação com um ficha-suja. Em todo esse processo, outro fato inesperado oxigenou muito o nome de Rollemberg: a morte do candidato à Presidência da República Eduardo Campos (PSB). A tragédia acabou turbinando a campanha do socialista e deu a ele a visibilidade de que precisava para deslanchar. Um ano atrás, quando se desenhava o projeto de fazê-lo governador, quase ninguém apostava nele como uma liderança robusta no DF. Nem mesmo o próprio, que vinha de um mandato pouco expressivo no Senado. Agora, com a ideia de renovação pairando sobre o político, existe gente dentro do PSB que sonha alto e já traça planos para uma possível candidatura à Presidência da República (veja o quadro no final da matéria).
Entre o bloco, a roça e Aracaju
A infância, na Asa Sul, e a juventude agitada fazem de Rollemberg um legítimo representante da geração Brasília
Teresa Rollemberg: grávida, ela posa com onze dos quinze filhos que teve. No detalhe, Rodrigo com cara séria (Fotos: Arquivo pessoal)
Fazenda dos Rollemberg, em 1977: montado num cavalo, uma das suas grandes paixões
Jovem empreendedor: Rollemberg (sem camisa) carrega com o amigo Valdeone uma panela de queijo para vender no Senado
Festa em Aracaju: dançando com a irmã Rosa Clara em 1977
Depois de bronca do pai: aos 21 anos, apreensivo, ele se casou com Márcia Helena, que estava grávida
Veraneio em Aracaju: com a primogênita, Gabriela, na orla da Praia de Atalaia, em 1981
...E a prole aumenta: no colo dos pais, Gabriela e o menino Ícaro, batizado no dia da foto
Cercado pela família: Loyane (nora), Ícaro (filho), Pedro Ivo (o filho mais novo), Márcia Helena (esposa), Gabriela (a filha mais velha) e Rodrigo (genro)
Oitavo filho de uma prole de quinze, Rodrigo demorou para manifestar essa vocação política. Quem se destacava nessa seara desde cedo na família Rollemberg era o mais velho, Armandinho, que militava na esquerda e participou do primeiro discurso de Luiz Inácio Lula da Silva na capital. Mas o primogênito entre os homens resolveu seguir carreira de jornalista político e virou um dos profissionais mais respeitados na década de 70. Rodrigo trilhava outro rumo, tornando-se aos poucos um legítimo representante da geração Brasília, predicado que tanto adora. Quando jovem, tinha os cabelos compridos e cacheados e era o xodó das meninas. Nas festas, fazia sucesso. Aos 15 anos, já bebia e fumava. Durante a noite, seguia com os amigos a pé pelas quadras do Plano Piloto em busca de balada. “Nós éramos uma turma de quatro e andávamos por quase toda a Asa Sul olhando as janelas dos prédios no sábado à noite. Onde havia luz negra, já sabíamos que existia uma pista de dança improvisada na sala”, relembra Mássimo Jório, um dos amigos de infância do futuro governador. Naquela época, Brasília respirava uma liberdade sem muito freio. Com receio de ter os filhos presos pelos policiais, os pais chegavam a permitir que eles fumassem maconha dentro de casa. “Quem disser que não fumava está mentindo. Ela fazia parte da nossa realidade”, diz Jório.
Nos fins de semana, Rollemberg e sua turma também rumavam para as fazendas que os pais de seus amigos mantinham em cidades próximas. A família de Jório, por exemplo, tinha uma propriedade chamada Montes Claros, em Luziânia (GO), a 100 quilômetros da capital. O lugar era ponto de encontro da galera por causa de um riacho que cortava o terreno. Eles chegavam na sexta à tarde e só voltavam para o Plano Piloto na noite do domingo. Márcia Margareth Rosa, uma das amigas da época, conta que eles acordavam com um copo de cerveja ou batida de cachaça na mão. Ao fim do dia, tontos com o efeito do álcool e da maconha, todos tiravam a roupa e se jogavam nus na água corrente. Nessa ocasião, Rollemberg já namorava Márcia Helena — o casal ocupava uma suíte na casa de campo. “Era um clima festivo e inocente. Não havia maldade”, relata a amiga Márcia Margareth. Naquele período, a família Rollemberg possuía a fazenda Santa Teresa, também em Luziânia. Quem tocava o negócio era o irmão, Ricardo. Seguiu assim até 1981, ano em que ele sofreu um violento acidente de carro e permaneceu meses em recuperação hospitalar. Coube, então, a Rollemberg administrar o rancho com gado, plantação e aves. O fato fez com que os encontros na propriedade de Jório se mudassem para o endereço rural dos Rollemberg. Depois de assumir essa responsabilidade, Digão, como Rollemberg é chamado pelos amigos até hoje, passou a ter uma postura mais séria diante da vida. Chegou até a comprar a própria fazenda em Luziânia, batizada de Araras, e pensar seriamente numa trajetória como produtor rural. No entanto, a convivência com senadores e deputados no Congresso e o curso de história na Universidade de Brasília (UnB) o empurravam para o mundo da política. “Participei da reconstrução da União Nacional dos Estudantes (UNE). No Senado, trabalhei nos gabinetes de Saturnino Braga e Jamil Andrade. Essas foram as minhas maiores influências”, conta Rollemberg.
Apesar de o pai ser fazendeiro e ministro do Tribunal de Recursos, hoje Superior Tribunal de Justiça (STJ), a vida dos Rollemberg sempre transcorreu com dificuldade. Teresa, a matriarca, diz que nunca faltou nada em casa. Mas manter quinze filhos custava caro. No Natal não havia como adquirir brinquedo para todo mundo. Diante disso, ela ia para a fazenda e pegava todo tipo de bicho. “Um ganhava coelho; outro, pato; a outra, uma galinha... Tinha até quem recebia pombo”, lembra. Segundo a mãe, Rollemberg foi um bebê calmo, não chorava nem dava trabalho. Quando criança, ficou sapeca. A professora Yone Maria Corrêa, pioneira na Escola Classe 206, onde todos os Rollemberg iniciaram os estudos, recorda que o menino, com 7 anos, brincava nos vãos empoeirados da superquadra e entrava na escola para pedir merenda mesmo fora do seu turno. “Ele perguntava o que tinha para comer. Eu oferecia polenta com carne moída, mas dizia que só serviria se ele lavasse o rosto e as mãos, que estavam sempre cobertos de barro”, afirma a docente.
Perto do atual contexto financeiro do GDF, os apertos com dinheiro na infância devem ser lembrados como uma fase de vacas gordas. Paralisação das aulas da educação infantil e do ensino fundamental públicos, desabastecimento de materiais e medicamentos em hospitais do governo e a não renovação de contratos de serviço de segurança armada são apenas alguns riscos que ele pode enfrentar a partir de janeiro. “A situação do GDF é bem pior do que eu pensava”, diz Rollemberg.
Arrumar soluções viáveis para a capital ainda na fase de transição já tem estendido a agenda de Rollemberg e provocado as primeiras baixas na sua rotina social antes mesmo da posse. Está difícil encontrar seus amigos de brincadeiras na quadra e da juventude festeira. “Saímos juntos depois da eleição, mas não conversamos direito. O telefone dele toca a toda hora e chega mensagem o tempo todo. Na rua, as pessoas querem cumprimentá-lo e fazer selfie”, queixa-se Jório, o mais próximo dessa turma. Quando falava com VEJA BRASÍLIA sobre o amigo de farra que virou governador, resolveu ligar para Rollemberg. Ele não atendeu. Em seguida, animado por três doses de cachaça, o cúmplice de esbórnia resolveu deixar um recado: “Digão, estou dando entrevista sobre você. Falei tudo o que a gente aprontava nesta cidade. Espero que não fique chateado. Um grande abraço”.
Rollemberg para presidente. Será?
Plano do PSB é fazer do político uma liderança nacional do partido
O secretário de Mobilidade, Carlos Tomé, o vice Renato Santana e Rollemberg: espanto ao verem o tamanho do abacaxi que precisarão descascar (Foto: Michael Melo)
Com a morte de Eduardo Campos, a maior expressão do PSB, o futuro comandante do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, surge como uma possível liderança nacional da sua sigla. “Tudo vai depender do desempenho do seu governo. De qualquer forma,o DF é uma grande vitrine e ele tornou-se um dos candidatos naturais para substituir Campos”, diz o presidente nacional da legenda, Carlos Siqueira.O partido não vai perder temponesse sentido e já cultiva planospara emplacar Rollemberg na mídia nacional. Repaginar o socialista,que nunca investiu pesado na sua apresentação pessoal, será o primeiro passo. Durante a campanha, ele usava sempre o mesmo figurino: camisaazul-bebê e calça jeans que elemesmo comprava na Feira de Ceilândia por 60 reais. Seus ternos,ele adquire numa loja popular do Conjunto Nacional. A ideia é vesti-lo em 2015 com mais sofisticação. Para ocupar o lugar deixado por Campos, os mais próximos defendem que Rollemberg precisa ir além do figurino, recorrendo a aplicações de Botox,a toxina que puxa, estica e remoça. Dentes um pouco tortos e amarelados, em decorrência do hábito de fumar, são outras características que deverão ser abandonadas em virtude desse projeto. O novo mandante do DF não está sozinho na disputa pelo postode estrela nacional do PSB. Paulo Câmara, o governador eleito de Pernambuco, está no páreo. Jovem — ele tem 42 anos — e bonito, tem a vantagem de ser uma espécie de herdeiro direto do legado de Campos. Márcio França, o vice-governadoreleito de São Paulo, aparece como outro candidato forte à vaga. Hoje, Rollemberg pode não assinar embaixo de toda essa operação, mas, comos palácios do Buriti e do Planaltona mesma via, é difícil não sonharcom algo que está no seu horizonte.
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