No atual cenário do jazz brasileiro, o destaque emergente do saxofone é o brasiliense Ademir Junior. Ele acaba de lançar a joia rara "Camaleão I", ao lado de instrumentistas do quilate de Jessé Sadoc, Bob Mintzer e Idriss Boudrioua. Nessa entrevista, ele nos conta a sua trajetória musical e também sobre o seu mais novo cd.
Ademir Junior, só, com Sadoc, Lula e Barata, sexteto, Bob Mintzer e cd.
Wilson Garzon
Wilson Garzon - Fale-nos um pouco sobre a sua formação musical. O saxofone foi sempre a sua primeira escolha?
Ademir Junior - Iniciei meus estudos aos 7 anos com meu pai, na clarineta. Mas só comecei levar a sério aos 10 anos, quando entrei na banda do Sesi, lá fiquei até os 13. Em 1988 entrei para a Banda Sinfônica da Escola de Música onde fui solista na clarineta e também tive oportunidade de tocar dois concertos para clarineta e banda. E depois entrei na Orquestra Cristã de Brasília. Mas aos 13 anos várias coisas aconteceram ao mesmo tempo. Comecei a estudar na UNB com o professor e clarinetista Luiz Gonzaga Carneiro, conheci o trompetista Moises Alves e o saxofonista Idriss Boudrioua. Estes três músicos foram meus tutores do erudito ao amor pelo jazz e a improvisação de forma geral. Aos 17 anos tive minha primeira aula de harmonia com o Lula Galvão, e depois com o Ian Guest, dois mestres que me fizeram entender o mundo dos acordes e das escalas. Só desejei estudar o saxofone aos 18 anos, por influência do saxofonista Widor Santiago e do Moises Alves. O saxofone foi a grande sacada e me abriu portas infinitas na música. WG - Como o jazz surgiu na sua trajetória musical? Nessa época que influências foram decisivas para a sua carreira? AJ - Toda influência iniciou com o Moises Alves e depois com o Idriss. O Moises me mostrou quase tudo do que hoje tenho como influência. Naquela época não tinha mp3, pen-drive e nada do tipo, somente vinil, fitas cassete e cds. Então, a onda era ir pra casa do amigo e passar dias e noites ouvindo jazz. Em casa eu tirava solos e passava horas tentando improvisar, mas a principio sem entender nada. Era uma escuridão só. Depois das aulas de harmonia e de muito estudo individual de memorização, rascunhos e práticas foi que entendi de uma vez por todas as engrenagens da harmonia e também que tudo poderia ter explicação, ou quase tudo. Dos jazzistas, as principais influências foram Wynton Marsalis, Branford Marsalis, Eddie Daniels, Miles Davis, John Coltrane, Pat Metheny, Michael Brecker, Bob Mintzer, Kenny Garrett e Joshua Redman. No Brasil, Idriss Boudrioua, Moises Alves, Widor Santiago, Marcelo Martins e Arthur Maia. WG - Como você conceituaria seus dois primeiros trabalhos (Gratidão e Vitória na Cruz)? Há neles há uma forte presença da sua vertente religiosa? AJ - Sim, foi uma época de bastante busca espiritual e isso ficou bem impresso nos cds, mas a música nunca fugiu do primeiro plano. As notas estavam lá, com diferentes influências, mas pulsando com tudo que aprendi. O cd “Gratidão” é o que posso dizer sobre alcançar estabilidade de tudo que eu tinha até então estudado. Os solos estão todos muito conscientes de cada nota, motivos e intenções. São 12 composições com bastante influência nordestina e jazzística. Já no “Vitória na Cruz”, acaba sendo musicalmente um WG - "Brasilidades", em 2009, abre uma nova etapa na sua carreira, onde você faz uma releitura de diversos ritmos nacionais. É também o seu momento de consolidação como grande instrumentista brasileiro? AJ - O álbum "Brasilidades" de fato marca um novo momento musical e de vida. É uma verdadeira celebração a MPB, com 11 temas próprios e participações especiais do Hermeto Pascoal, Widor Santiago, Moises Alves, Juninho di Sousa e Trio cai dentro. Traduz uma infinidade de informações mais consistentes, principalmente em relação ao “Gratidão”. Tem uma banda fixa pela primeira vez e com isso o som vem mais coeso. Os temas são bem mais sofisticados e as harmonias em sua maioria com vertentes modais. Não tem tanta demonstração de técnica, mas a intensidade continua como nos outros dois. É um álbum bem objetivo e direto ao ponto, Musica Brasileira. O tema “Brasilidades” foi composto inspirado em um acordeom e exige muita versatilidade técnica, é um baião com uma harmonia modal que até lembra o blues, mas o blues e o baião se confundem mesmo a começar pela escala característica. Tem outros temas que marcaram fortemente esse trabalho, como “Fre-bop”, “Feira do Som”, “Açai”, “Familia”, “Beija-Flor” e “Vida de Músico”. A clarineta está menos presente, porém, bem intensa nas faixas “Villa-Bach” e “Vida de Músico”. A base foi com músicos amigos de Goiânia. Acredito que o que marca mais nesse cd não é o instrumentista, mas o músico em todos os aspectos. WG - Nesse ano você lança "Camaleão I". Qual foi o conceito em que se baseou para criar esse projeto? AJ - Já há algum tempo tenho percebido que gosto de diversos estilos e me adapto bem. Certa vez um amigo me chamou de Camaleão justamente por isso, então o projeto Camaleão surgiu na intenção de comemorar meus 25 anos de músico, gravando pelo menos três álbuns em diferentes estilos musicais. WG - Na minha opinião, o seu trabalho é muito dentro da linha dos combos de hardbop. Isso fica claro em relação à sua parceria com o trompetista Jessé Sadoc. É por aí? AJ - Esse trabalho sim, ficou caracterizado pela formação básica de sexteto e a parceria com o grande Jessé Sadoc resultou em um excelente resultado, lembrando algumas vezes os combos jazzísticos dos anos 60. WG - Outro destaque nesse seu trabalho são as homenagens a Coltrane e Hubbard. Foram programadas ou espontâneas? Como se deu a participação de Bob Mintzer? AJ - O álbum todo foi bem espontâneo. Algumas faixas foram criadas para este álbum, como "Camaleão", "Feelings", "Entre amigos" e "JC". O Jessé levou três músicas, “A prata e o ouro”, um samba a estilo sambop, “JT”, outro samba jazz que tem uma harmonia de blues menor na improvisação e o “Elegia pro Freddie”, uma Balada com pegada João Donato, mas que realmente no inicio lembra o nosso querido Freddie Hubbard. Levei outras duas músicas que já havia composto a cerca de 4 anos, “Melhor de 8”, um latin jazz com ênfase na escala diminuta e “Livre Acesso”, um baião com três partes distintas e harmonia modal/tonal. "Entre amigos" foi composta no dia da gravação, inspirada no saxofonista e amigo Idriss Boudrioua, é um samba em 7 e traz uma distinta sonoridade do naipe com tenor, alto e flugel. “Camaleão” inicia com um groove temático de funk e uma melodia meio espanhola em 10/8, já na segunda entra um baião, mais a música é cheia de surpresas rítmicas. Na gravação gastamos um pouco de tempo para entender toda a ideia da música, mas o resultado foi surpreendente, no final da faixa tem um dialogo de sax e trompete que vale a pena escutar, a coisa ficou bem séria musicalmente. “Feelings” é uma balada com melodias inicialmente compostas em intervalos de sexta e que se desenvolvem de forma lírica e sem complicações harmônicas. Os solos foram todos espontâneos e muito bem percebidos pelos músicos, o clima de todos juntos colaborou para um lindo resultado. “JC” é uma composição em cima da harmonia de “Countdown” de Coltrane. Todos nós saxofonistas conhecemos bem a gravação de “Giant Steps” com Bob Mintzer e Michael Brecker, então nessa faixa tive o sonho de convidar o Bob para fazer mais uma do Coltrane nessa formação de dois saxofones tenores. Foi simples, ele é muito profissional e gentil, fiz o contato e ele aceitou prontamente, mantendo tudo por e-mail. Ele gravou em NYC e enviou o áudio do solo. Já havíamos gravado tudo, então ele recebeu o playback com tudo pronto e deixou o recado musical, como sempre elegante e de uma beleza sonora única. Solo digno de estudos posteriores, e o sonho de um humilde brasileiro foi realizado. rsrs WG - Como se deu o processo de gravação: muita intensidade? Destaque aqui os músicos que participaram desse projeto. AJ - A princípio não seria um cd. A ideia era nos reunirmos apenas para gravar umas músicas, um tipo de encontro registrado de amigos. Mas a coisa tomou outra proporção no estúdio. Sentimos que ficou muito bom e que valeria completar algumas músicas e produzir todo um álbum. Foram duas sessões, uma com 13 horas, onde entramos madrugada adentro e gravamos 7 músicas, a outra alguns dias depois onde gastamos 10 horas, para gravar as últimas duas e mais difíceis, “Camaleão” e “JC”. O cd por incrível que pareça, foi feito dessa forma e sem nenhum ensaio. Apenas nos juntamos no estúdio, demos algumas passadas nas músicas e fizemos os takes de gravação, porém vale ressaltar o nível de músicos que estamos falando, são eles Jessé Sadoc, Victor Gonçalves, Lula Galvão, Alexandre Carvalho, Jefferson Lescowich, Rafael Barata e Idriss Boudrioua. Não é comum gravar um trabalho assim, mas só posso dizer que funcionou apesar do pouco tempo e também da dificuldade de agenda com esses músicos maravilhosos. WG - Quanto à divulgação de Camaleão I, como está sendo conduzida? Que shows estão em pauta nos próximos meses? Em relação a novos projetos haverá II e III? AJ - Houve lançamento em Brasília e Rio, agora estamos enviando proposta do show para festivais no Brasil e exterior para próximas agendas. Estou em fase de produção do Camaleão II e depois disso virá o III. Pretendo fechar tudo isso até final de 2014. Publicidade nunca é demais, então estamos sempre divulgando faixas e detalhes relacionados ao Camaleão. O público pode adquirir o cd virtual na Itunes, Cd Baby, Amazon, Reverbnation etc., e também pode baixar o aplicativo de cd para Android, gratuitamente. Internet ademirjuniorjazz.blogspot.com/ www.cdbaby.com › Ademir Junior http://www.reverbnation.com/ademirjunior https://pt-br.facebook.com/seriecamaleao www.youtube.com/watch?v=l2oTBsxxkNI |
terça-feira, 27 de agosto de 2013
A hora e a vez de Ademir Junior
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