quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Negligência custa vidas


Só a negligência explica a ocorrência de duas mortes em acesso alagado sob um mesmo viaduto de Ceilândia, no espaço de três meses.

Em 8 de outubro, a estudante Geovana Moraes Oliveira, de 6 anos, perdeu a vida a cerca de 200m da escola, quando o ônibus escolar em que seguia para as aulas entrou em pane e foi rapidamente inundado. Por sorte, mais de 20 crianças foram salvas. ...

Mas, na noite da última terça-feira, o também jovem Manoel Silva Júnior, 20 anos, não conseguiu escapar, êxito apenas obtido por duas pessoas que estavam com ele no carro e saíram nadando.

Exatos 105 dias transcorreram entre um episódio e outro, embora o problema seja primário: os bueiros não dão vazão à água da chuva, que escorre para o local vinda de quatro ruas em declive. Ou seja, a solução é igualmente elementar: aumentar os pontos de captação e alargar as galerias pluviais. Fala-se agora na substituição da tubulação, de 1.200 milímetros, por uma de diâmetro maior: 1.500 milímetros. A pergunta é: por que isso não foi feito antes? Ontem, o GDF interditou o trecho, na QNN 5/7. Espera-se que resolva de vez a questão, mas outra pergunta se impõe: e o restante do Distrito Federal?

Vamos a exemplo da mesma noite da segunda tragédia em Ceilândia. Não muito longe dali, duas pessoas ficaram presas num carro logo coberto pelas águas em Vicente Pires. Mais grave: nesse caso, o veículo estava retido por uma vala de quase meio metro de profundidade — em plena via pública. E a inundação começava em rua próxima, totalmente alagada. Por fim, engana-se quem pensa tratar-se de ocorrências isoladas ou localizadas. Às vésperas do Natal, um carro chegou a flutuar ao tentar acessar o Eixão na Asa Sul, e o casal de passageiros precisou ser retirado pelos bombeiros. Já na tesourinha da 210 Norte, nesse mesmo dia, ocupantes de uma caminhonete tiveram de subir no teto para esperar o resgate. 

Vale lembrar ainda, pelo tempo decorrido desde então, os estragos causados na Universidade de Brasília, em abril de 2011, por enchente que atingiu em cheio o Instituto Central de Ciências (ICC), causando prejuízos, à época, estimados em R$ 20 milhões. Ou seja, são situações já antigas, mas cada vez mais frequentes na unidade da Federação notória pelos longos períodos de estiagem, jamais aproveitados para a execução de obras preventivas para a chegada dos temporais. E não é por falta de alerta. Tanto que o Plano Diretor de Drenagem Urbana já identificara, dois anos antes do alagamento na UnB, gargalos na rede de drenagem pluvial nas proximidades da instituição.

Mas, para espanto geral, naquele mesmo abril de 2011, a população tomou conhecimento do programa Águas do DF, com orçamento de US$ 200 milhões, destinado à revitalização da rede de esgoto do DF, contemplando o Plano Piloto, Taguatinga e Ceilândia, mas ignorando o sistema pluvial das redondezas da UnB. Em outras palavras: quando não é omisso, o governo é incompetente — se age, planeja mal. Permitiu a ocupação desordenada, não fez as adequações necessárias para acompanhar a explosão demográfica, vê, enfim, o tempo passar, enquanto os problemas se acumulam. A questão é que os danos já não são recuperáveis. Vidas perdidas impõem mudança de rumo radical e urgente. 
Fonte: Jornal Correio Braziliense 

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