quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Quadrilha se infiltrou no Entorno

Cinco prefeituras de municípios goianos vizinhos à capital federal são suspeitas de envolvimento em lavagem de dinheiro. A fraude, praticada em fundos previdenciários, passa dos R$ 40 milhões

Cynthia da Cruz é suspeita de atuar como pastinha da quadrilha
O megaesquema de lavagem de dinheiro derrubado pela Polícia Federal durante as operações Miquéias e Elementar, deflagradas há uma semana, alcançou pelo menos três prefeituras do Entorno. Águas Lindas, Formosa e Cristalina estão entre as localidades goianas que apresentaram movimentações financeiras irregulares, segundo a corporação. Outras duas administrações locais, de acordo com o Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás, também apresentaram indícios de lavagem de dinheiro. No total, teriam gerado rombos de mais de R$ 40 milhões em fundos previdenciários.


 
 
Águas Lindas figura nos relatórios de inteligência da PF por ter aplicado valores em fundos considerados arriscados. A manobra garantiria uma parcela do valor aplicado aos gestores. Um relatório de auditoria do Ministério da Previdência Social sobre os investimentos realizados pela Funprev, da própria cidade, revela que ela repassou valores de fundos rentáveis para outros em situação de deterioração financeira. Portanto, sem condições de arcar com os vencimentos. ...


 Uma das citadas é a Adinvest Top Fi. Apesar de, à época, uma comissão de valores mobiliários do governo federal ter divulgado a incapacidade financeira desse fundo, em 11 de dezembro do ano passado, recebeu da Funprev R$ 4 milhões. A auditoria revelou ainda que o município aplicou 27,44% do patrimônio total dela, ou seja, na contramão do limite estabelecido no artigo 13 da Resolução Conselho Monetário Nacional (CMN), de 20% para aplicações de uma mesma conta de investimento.


 Consta ainda no relatório da PF que mulheres bonitas, apelidadas de pastinhas, eram responsáveis por cooptar prefeitos e gestores de fundos de previdência municipais para receberem vantagem indevida. As aplicações irregulares em fundos de previdência de Águas Lindas, por exemplo, teriam sido feitas após a visita de Cynthia Cabral Soares da Cruz. A mulher é acusada de atuar como pastinha do esquema de lavagem de dinheiro liderado pelo doleiro Fayed Traboulsi e do ex-policial civil Marcelo Toledo Watson (leia Memória).

  
Cynthia aparece em uma conversa telefônica sobre Águas Lindas com Fayed, em 9 de novembro do ano passado (veja diálogo). Coincidentemente, dois dias antes, as administradoras da Funprev solicitaram o resgate de R$ 2 milhões de uma conta sem restrições aparentes para aplicar no fundo da Adinvest Top Fi, que já vinha apresentando prejuízos. Cynthia foi presa no último dia 19, assim como Luciane Hoepers, também acusada de atuar como pastinha da quadrilha — Luciane confessou, em depoimento, que cooptava prefeitos.


 O relatório do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás aponta uma fraude em fundos de previdência de 11 municípios goianos. Além de Águas Lindas, que apresentou um rombo total de R$ 9.184.129,19, Formosa, Alexânia, Cristalina e Valparaíso tiveram movimentações ilegais (leia Prejuízo). Formosa registrou R$ 18 milhões de prejuízo. Alexânia, R$ 2,8 milhões. E Valparaíso, R$ 794 mil, com irregularidades em sobrepreço na aquisição de títulos públicos em 2008. Já Cristalina teria mostrado distorções de R$ 11.064.368,79 entre o balancete entregue ao tribunal e os extratos bancários de dezembro do ano passado.


 O ex-prefeito de Águas Lindas Geraldo Messias, à frente da administração local no período 2008—2012, afirmou desconhecer os repasses para os fundos de investimento relacionados ao suposto esquema criminoso. “A decisão de onde o dinheiro seria aplicado não passava por mim. Eu apenas repassava para a Previdência de Águas Lindas os valores que eu tinha que repassar. Durante a minha gestão, ela funcionava como uma autarquia. Tem prefeito que mantém o fundo de previdência sob a sua tutela, mas não foi o (meu) caso”, ressaltou. “Nesse mundo de negociações, tem de tudo. Mas, como eu não tinha influência sobre o dinheiro, não fui procurado por essas mulheres, graças a Deus”, afirmou.


 O advogado do doleiro Fayed Traboulsi, Celso Luiz Braga Lemos, disse que a suposta ligação de Fayed com as pastinhas não comprova a relação criminosa. “São pessoas responsáveis por fazer contato com interessados. É um trabalho regular, não está inscrito no Código Penal. As pastinhas faziam a promoção do produto que elas tinham para vender”, alegou o defensor, que ainda não definiu quando entrará com o pedido de habeas corpus em favor do cliente. “Estamos debruçados sobre todo o material de investigação”, resumiu. Raul Livino, advogado de Marcelo Toledo, afirmou que ainda estuda o processo e que só se manifestará em nome do acusado caso provas forem apresentadas pela PF.


Prejuízo


 Relatório do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás, referente ao período de 2008 a 2012, aponta fraude em fundos de previdência de 11 cidades goianas, algumas do Entorno:


» Águas Lindas de Goiás
Total do rombo

R$ 9.184.129,19

» Formosa
Total do rombo

R$ 18.013.106,74

» Cristalina
Total do rombo

R$ 11.064.368,79

» Valparaíso
Total do rombo

R$ 794.653,48


Memória

Megaesquema desvendado


 Deflagradas pela Polícia Federal há uma semana, as operações Elementar e Miquéias desvendaram um dos maiores esquemas de lavagem de dinheiro dos últimos anos no Brasil. Pelo menos 20 pessoas foram presas, entre elas, dois delegados e um agente aposentado da Polícia Civil do DF. A apuração contou com a ajuda do Núcleo de Combate às Organizações Criminosas (NCOC) e do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e demonstrou uma movimentação de R$ 300 milhões nos últimos 18 meses. Do total, pelo menos R$ 50 milhões foram aplicados intencionalmente em recursos de fundos de investimentos da Previdência Social e administrados por prefeituras.


 O megaesquema demonstrou a influência de políticos atuando em áreas sensíveis dos governos local e federal. O doleiro Fayed Traboulsi (foto) e o policial civil aposentado Marcelo Toledo Watson, apontados no inquérito da PF como os líderes da organização criminosa, foram presos. Com os suspeitos, a PF apreendeu vários veículos de luxo, como um iate, uma Ferrari e um Lamborghini Gallardo — os carros estão avaliados em R$ 1,6 milhão cada.


 Na operação Miquéias, também acabaram detidos o delegado da Polícia Civil Paulo César Barongeno e Sandra Silveira, exonerada em maio deste ano do cargo de assessora jurídica da Secretaria de Segurança Pública do DF. Barongeno obteve, no mesmo dia da prisão, um habeas corpus.


Mais um se apresenta à PF


 O acusado de ser um dos líderes da quadrilha investigada pela Operação Miquéias se entregou ontem à PF. Carlos Eduardo Carneiro Lemos estava foragido. Segundo a polícia, ele é sócio do doleiro Fayed Traboulsi e do agente aposentado Marcelo Toledo na Invista Investimento Inteligentes. Os investigadores destacam que o suspeito tem “grande experiência com fundos de investimentos e mercado de capitais”. Ontem, ele Depôs na PF, no Rio.
 
 
Por Mara Puljiz, Gabriella Furquim e Amanda Almeida

Fonte: Correio Braziliense

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