quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Chegou a hora da cadeia.


André de Souza
Carolina Brígido
 
-Brasília-
 
Passados oito anos da revelação de que o governo Lula pagava parlamentares em troca de apoio político no Congresso, no chamado esquema do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a execução imediata das penas impostas para a maioria dos 25 condenados no processo, julgado no ano passado: 18 réus estão nessa situação. Para onze deles já está certo que vão ter que começar a pagar pelos crimes. Outros sete terão a pena exata decidida hoje, durante a retomada do julgamento.
 
Pelo menos 15 réus deverão ir para prisão em regime fechado e semiaberto. Outros três terão que cumprir pena alternativa. Entre os que já terão a pena executada tão logo o STF emita uma ordem de prisão estão José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, apontado como mentor do men-salão; o deputado José Genoino (PT-SP), que presidiu a legenda; o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), delator do esquema; e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. Eles cumprirão pena em regime inicialmente semiaberto.
 
Também serão presos imediatamente Marcos Valério, operador do mensalão, e o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzo-lato, ambos em regime fechado. O ex-deputado Romeu Queiroz (PTB-MG) e o ex-tesoureiro do PL (atual PR) Jacinto Lamas vão para regime semiaberto. Três réus cumprirão pena alternativa de prestação de serviço à comunidade: o ex-tesoureiro do PTB Emerson Palmieri, o doleiro Enivaldo Quadrado e o ex-deputado José Borba (PMDB-PR).
 
Ficou decidido que três réus não cumpririam pena ainda: o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), cuja situação será definida em breve pelo STF; o ex-assessor parlamentar do PP João Cláudio Genu; e o doleiro Breno Fishberg. Os dois últimos têm pena a cumprir por apenas um crime — lavagem de dinheiro — e tem direito a embargos infringentes para essa condenação.
 
O STF ainda não divulgou o nome de todos os condenados que começarão a cumprir pena. Segundo a decisão, não serão punidos agora os crimes questionados por meio de embargos in-fringentes, o recurso que dá aos réus o direito a um novo julgamento. O benefício de não ser encarcerado imediatamente foi estendido inclusive a quem não tem direito ao recurso, mas mesmo assim o ajuizou. Segundo o Regimento Interno do tribunal, só podem entrar com infrin-gentes condenados que obtiveram ao menos quatro votos pela absolvição.
 
A decisão gera algumas distorções. Dirceu, por exemplo, só recorreu do crime de formação de quadrilha, mas não da corrupção ativa. Portanto, será preso. Se ele tivesse recorrido das duas condenações, mesmo sem ter direito, teria I se livrado das grades.
 
Na sèssão de ontem, o presidente do tribunal e relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, propôs a execução imediata da pena de 22 réus. Isso porque ele excluía apenas os réus cu! jas penas eram passíveis de revisão com embargos infringentes. Mas venceu a proposta de Teori Zavascki. Para ele, quem entrou com infringentes e não tinha direito ficaria de fora do rol de presos.
 
Barbosa determinou que assessores elaborassem uma lista de quem seria preso agora e quem ficaria em liberdade, segundo a decisão do STF. Na sessão de hoje, Barbosa vai apresentar um quadro com a situação de cada réu e discuti-la com os demais ministros da Corte.
 
— Se houve recurso, não transita em julgado, porque aqui não é o momento de fazer juízo admissibilidade do recurso. Nos casos que há embargos infringentes, cabíveis ou não, não tem transito em julgado — argumentou Zavascki no julgamento.
 
— Esses recursos são manifestamente incabíveis. Não têm os quatro votos — discordou Barbosa.
 
— Não é aqui o momento de julgar isso — res: pondeu Zavascki.
 
Barbosa e o ministro Luís Roberto Barroso voltaram a defender a prisão de um leque maior de condenados.
 
— Ou seja, nós vamos pinçar alguns réus e, por força de uma filigrana, não vamos executar as penas — disse Barbosa.
 
— Estamos dizendo aos que não interpuseram embargos infringentes: da próxima vez, interponham, porque haverá alguma vantagem. Estaremos fomentando um sistema recursal caótico. Onde o não cabimento for manifesto, não há razão para estimular esse carnaval de recursos — acrescentou Barroso.
 
O ministro Gilmar Mendes fez uma dura crítica à proposta de Zavascki. Para ele, a tese beneficia quem apresentou embargos infringentes, mesmo sem ter direito ao recurso. Quem não tinha direito ao recurso e, por isso, não o ajuizou, ficou prejudicado, porque começaria a cumprir a pena imediatamente.
 
— Isso é manipulação. Não é possível mais transigir com esse tipo de coisa. Estamos estabelecendo o princípio da eternização das demandas. Entra-se com embargos infringentes, ainda que manifestamente incabíveis... Aquilo a que chamam justiça deixou de existir. Vamos estar com o guichê dessa Corte aberto para esse tipo de manobra. Não me parece razoável. O tamanho do absurdo constrange — protestou o ministro.
 
Mendes exclamou, indignado, que o processo do mensalão ""não anda pra frente, anda em círculos"! E questionou, retoricamente, a quem interessaria esse tipo de manobra. Barbosa respondeu:
 
— Direi isso no dia em que sair do tribunal, com todos os detalhes.
 
Acompanharam Zavascki os ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. Marco Aurélio Mello é a favor da possibilidade da execução parcial das penas, mas acha que deve haver primeiramente a publicação do acórdão, documento que transcreve o que aconteceu no julgamento.
 
Exaltado, Barbosa voltou a criticar o voto de Zavascki, descontentando o colega.
— Isso é chicana consentida explícita — disse Barbosa.
 
— Vossa Excelência está usando uma linguagem... — respondeu Zavaski.
 
— Eu uso a palavra que bem entender, ministro. Usei essa palavra aqui e voltarei a usar. Essa palavra tem significado. O tribunal se recusa a deliberar e a tomar uma decisão grave. Se vale de firulas processuais para evitar, para postergar — disse Barbosa, que continuou: — Isso aqui é uma Corte Suprema. Não basta que apresentemos argumentos que convençam uma pequena comunidade de insiders. É um país inteiro que está envolvido. Quando uma instituição se degrada, o país se degrada.
 
O Globo

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