domingo, 2 de novembro de 2014

Entrevista - Renato Santana "Sou soldado, mas quero estar na rua"


À espera da escalação do time de Rollemberg, vice-governador eleito diz que pretende somar
Patrícia Fernandes e Soraya Sobreira
redacao@jornaldebrasilia.com.br

Paulo Gusmão, Eduardo Brito e Millena Lopes
redacao@jornaldebrasilia.com.br

Orgulhoso das raízes humildes em Brazlândia e Ceilândia, o vice-governador eleito Renato Santana (PSD) diz que será um soldado leal ao governador eleito Rodrigo Rollemberg (PSB), mas garante: não será um soldado de quartel. À espera de ser escalado para atuar no novo governo, de uma coisa ele tem certeza: não quer ficar no gabinete. Quer ir para a rua, “para a ponta”, a exemplo do que tem feito nos 20 anos de serviço público, que serão completados no próximo dia 24. Aos 41 anos, Santana diz que pretende continuar morando no P Norte, bairro de Ceilândia, e cita seu endereço na QNP 13, para lembrar que, durante a campanha, várias pessoas bateram em sua porta, para se certificar de que era ali que ele vivia.  “Eu  gosto muito de feira e tenho sangue nordestino. E a Ceilândia é isso, cheira a povo, a gente”, destaca.  Os hábitos simples não mudarão, o vice-governador afirma. Mesmo depois da posse, marcada para  1º de janeiro de 2015,  ele diz que continuará a lavar a garagem de sua casa, como de costume. “Nada disso me envaidece”, resume.   

O senhor já disse que não pretende ser um vice-governador de gabinete. O senhor já tem alguma ideia de como será seu papel neste governo?
Eu estou no Governo do Distrito Federal  há 20 anos e eu, recém-empossado, ocupei algumas funções de direções. Fui lotado na Administração Regional de Taguatinga, onde trabalhei de quatro para cinco anos, e fui para a Administração Regional de Ceilândia, porque pretendia trabalhar perto de casa e lá estou até os dias atuais. Fui diretor de Cultura da administração durante sete anos. Na sequência, fui diretor Administrativo e chefe de gabinete. Depois, fui administrador regional também da Ceilândia. E, em seguida,  secretário de Governo (no mandato-tampão de Rogério Rosso). Em todas essas funções, eu procurei exercer meu trabalho na rua, na ponta. O setor produtivo utiliza muito o termo "Quem engorda o boi é o olho do dono". Em uma gestão de governo, não é diferente.

Vai ter alguma área que será confiada ao senhor no novo governo?
Em Brasília, historicamente, o vice-governador sempre teve uma atribuição executiva. Eu, como servidor,  nunca tive um cargo eletivo. Agora, sou vice-governador. Mas Rodrigo Rollemberg é o governador do Distrito Federal e eu serei leal a ele. Deixarei ele muito à vontade. Serei um soldado, mas não um soldado de quartel. Eu quero estar na rua. Essa é a expectativa da população. No período de campanha, esse foi um tema muito explorado. A população cobrava. Nós queremos discutir o Distrito Federal e cuidar de gente. Quando eu digo que não quero ser um soldado de quartel, o objetivo é ajudar o Rodrigo (Rollemberg) efetivamente a governar, ajudando a buscar soluções para os graves problemas que ainda enfrentamos. Queremos somar esforços. Eu acho que governador e vice-governador de gabinete, com paletó na mesa, estão fadados ao fracasso.

Mesmo o senhor sendo uma liderança da Ceilândia, o adversário de Rollemberg obteve mais votos lá, que é o maior colégio eleitoral do DF. A que o senhor atribui isso?
Essa coligação PSD, PDT, SD e PSB nasceu com muita naturalidade e transparência. E eu, no PSD, me preparava como um dos que moravam na Ceilândia e que convive há 20 anos na região com as ausências do Estado. Eu nunca tive pretensão de ser candidato, mas o partido entendeu que eu deveria disputar a eleição para deputado distrital e eu me preparava para isso. Depois, o Rogério Rosso (presidente do PSD-DF) me fez o convite (para ser candidato a vice-governador) e o conselho político da coligação aprovou. A ideia da coligação era trazer o sentimento de que Brasília é uma só. E, de fato, é. A ideia era uma candidatura de um agente político que construiu sua carreira na região central de Brasília e de outro que fosse filho de Brasília e que morassem em uma região administrativa. A nossa coligação foi para o enfrentamento com uma coligação de figuras históricas da política no Distrito Federal, com uma penetração maior nessas regiões. Ceilândia é o maior colégio eleitoral e, historicamente, é invadida no período eleitoral pelos candidatos, que acampam lá. Mas não acho que houve derrota. Pelo contrário.  

Você pretende continuar morando em Ceilândia?
Eu moro no P Norte por opção, por que a Ceilândia foi a cidade que me acolheu, que me deu tudo o que eu tenho e, sobretudo, as boas amizades. Eu sou filho de feirante, trabalhei em feira até a adolescência. Eu  gosto muito de feira e tenho sangue nordestino. E a Ceilândia é isso, cheira a povo, a gente. Eu tenho imóveis em outras regiões, mas tenho dificuldade de sair de lá. Morar numa cidade é participar da vida efetiva do lugar. 

A campanha da sua chapa começou com quatro partidos e, agora, novos grupos políticos se aproximaram. Como o senhor vê isso?
Em uma eleição de dois turnos, é natural que apoios se acheguem. Mas eu acredito que eles precisam passar pela mínima aproximação do programa de governo. Obviamente, se você analisar a condução que o Rodrigo  deu ao processo, ele foi muito focado em propostas. Em momento algum, os apoios vieram em troca de  cargos no governo. Este momento de transição, por exemplo, é mal interpretado ao extremo. E este é o momento de construir uma equipe técnica para entender a saúde da empresa pública. Transição não é ato político. Rodrigo tem pedido às pessoas que indiquem técnicos e conhecedores das áreas e que ajudem a processar essas informações. O oportunismo tem que ser promovido pela população, no sentido de ter oportunidade de estar nessa fatia boa da cidade. A ideia não é começar a construir comparativos de partidos. A ideia é construir a cidade. O governo é constituído de pessoas e, ao longo do tempo, você vai ajustando as coisas. Com esses partidos que foram chegando pela afinidade de ideias e propostas, obtivemos a vitória.

Esta é a primeira vez que teremos um vice-governador que nasceu e mora em uma região administrativa fora do Plano Piloto. O que significa isso, na sua opinião?
O sentimento não é esse, de chegar ao poder. O sentimento é de que essas regiões administrativas que compõem a maior faixa de território no Distrito Federal têm elementos para participar efetivamente dessa discussão. Essa divisão não existe mais. Isso tem cheiro de preconceito. A Ceilândia, há 20, 25 anos, vivia um forte preconceito. Os próprios moradores se vestiam disso. E nós precisamos combater esse tipo de sentimento em qualquer que seja a esfera. Não é o sentimento de que essas regiões administrativas chegaram ao poder. Essas regiões têm a digital de ser Brasília. 

 O senhor falou que deixará o governador eleito muito à vontade para te dizer de que forma poderá contribuir com o governo, mas com que área o senhor teria mais afinidade?
Os gestores que fazem parte dessa coligação têm tido o sentimento de que o governador escalará o time. E comigo não é diferente. Se digo para você que sou soldado e sou leal, não tenho que escolher posição. 

Desde que não seja no gabinete...
Desde que não seja no gabinete. Porque, no gabinete, você não joga, você vira despachante. E a cidade  já  disse o que ela não quer. A cidade espera resultados. 

O deputado federal eleito Rogério Rosso já mencionou um projeto que confere autonomia financeira às administrações regionais, com retenção de parte das receitas de arrecadação, por exemplo. O senhor concorda com isso?
Primeiro, nós não podemos mais ter um administrador regional por acaso. No PSD, eu apresentei esse programa que pode ser aplicado dentro da proposta de eleição direta para administrador regional, que é uma das bandeiras defendidas  com muita propriedade pelo governador Rodrigo Rollemberg. A autonomia financeira que o PSD defende é que é, no mínimo, justo, que um percentual do que se arrecada fique retido na administração regional, para que o administrador saiba com quanto pode contar para trabalhar sem perturbar o governador. O governador, por sua vez, tem que cobrar metas e resultados. Essa proposta foi absorvida no programa de governo e agora precisamos estudar a metodologia para se aplicar. 

Rollemberg já  disse que, até que se estabeleçam as eleições diretas como ele pretende, os  administradores serão escolhidos em conjunto com as lideranças comunitárias das regiões. O senhor vai participar da escolha do administrador de Ceilândia?
No programa de governo, esse foi um dos temas mais debatidos, explorados e questionados. A participação de todo esse grupo que compõe esse primeiro momento de transição e o conselho político é de construir mecanismos para que nós  tenhamos o mínimo, ou reduzido a zero, do braço político na indicação e na escolha dos administradores regionais. Se não, nós vamos fazer o mesmo e nós queremos fazer diferente. 

Então o senhor poderia participar dessa escolha como morador de Ceilândia, mas não como vice-governador?
Vamos ouvir as entidades - como Rotary, Lions, associação comercial, igrejas, associação de micro e pequenos empresários, presidentes de feiras, de clubes, associações culturais e esportivas, academia de letras, clube de mulheres -   e eu não sou uma entidade. Ceilândia é a região que mais tem prefeituras e associações comunitárias. Esses segmentos serão ouvidos. São essas pessoas que fazem a cidade no dia-a-dia. E vou dizer mais: essas pessoas sabem quem tem o mínimo e quem não tem para conduzir o processo de administrar a cidade. E a partir daí, vamos construir como será feita a eleição direta. 

O que muda na rotina do Renato Santana, a partir de agora, com o mandato de vice-governador?
Vou continuar lavando a garagem da minha casa, como sempre fiz. O sentimento é de que esse cuidar da sua casa pode ser estendido para o cuidar da cidade.  O que eu mais convivi foi com a falta de segurança nesses meus mais de 40 anos de vida. Eu sempre cheguei na Ceilândia ou nos quatro cantos do Distrito Federal com esse sentimento. E é isso que nós temos que reduzir. Eu sou um cidadão comum e ser vice-governador não pode servir para mudar exclusivamente a minha vida. Lá no P Norte, se eu começar a perceber que aquele ambiente começou a mudar, minha vida muda. Naturalmente. Mas ela tem que começar a mudar com essa percepção que as pessoas têm que a vida delas também está mudando. Eu não quero absolutamente nada que não seja meu. Agora, eu acho que não perdemos nada em ajudar e o dever do eleito é de ajudar a construir uma cidade melhor, mais segura, sem esse papo de perseguição. Nós andamos, na campanha, 30 mil quilômetros. E por isso estou dizendo que não serei um vice-governador de gabinete, assim como não fui um candidato de ficar no sofá, imaginando: “Vai dar certo e eu estou dentro”. O mais difícil está por vir. Temos que comemorar o dia que conseguirmos baixar o índice de violência, de evasão escolar...  Eu tenho 41 anos e posso afirmar que não tenho compromisso com sacanagem de ninguém. Estou fora. Eu emprestei minha vida, encarei a ausência dos meus filhos, da minha esposa, na tentativa de oportunizar uma melhor qualidade de vida para as pessoas. Somente isso. Quero contribuir com lealdade com o Rodrigo. Sempre. Independentemente de partido. Meu compromisso foi proposto lá atrás e é o compromisso de cuidar de Brasília. E posso dizer: nada disso me envaidece. Quero contribuir. E tenho otimismo sempre. Temos que ajudar o governo que aí está, tanto na esfera local quanto na esfera federal.
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília

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